Permanência e inovação nas redações

Por Beatriz Rodrigues e Karen Bandeira



      O que ficou e o que será? Em nossas visitas às redações de jornais e revistas no eixo Rio-SP, com tantas modernizações visíveis nos espaços e rotinas de produção, refletimos sobre o que permanece conduzindo o processo de confecção de pautas, de práticas de apuração, modos de redigir, editar e publicar. Também levamos em conta a decrépita situação de nosso mercado de trabalho, que cada vez mais contrata pessoas mais novas e substitui os seniores, questionando que papéis jornalistas experientes desempenham nesse cenário cotidiano.

     A visão clássica em nosso imaginário sobre as redações de um jornal de grande porte, ancorada pela cinematografia de filmes como Todos os Homens do Presidente, nos remete a aquele espaço imenso, imponente, de um prédio com salas largas separadas por um conjunto de baias, antes marcadas pelas máquinas de escrever e depois pelos microcomputadores.



Anna Wintour, editora-chefe da VOGUE nos Estados Unidos, exemplo desse estereótipo.


     E os editores? Essas figuras respeitadas e temerosas (foto à direita), que se isolavam em aquários de vidro, vigiando a produção e, quando preciso, protegidos por persianas para conversas confidenciais.

     Há bem pouco tempo, apesar da modernização computacional, o cenário era esse mesmo. Mas algo de novo aconteceu. Por dois fatores: um negativo e outro positivo. O negativo não é novidade: um amplo enxugamento das redações. Nesse caso, o que mais vemos hoje são muitas baias vazias, não sendo ocupadas por ninguém. Os diversos “passaralhos” dos últimos tempos estão diminuindo e muito a quantidade de pessoas que trabalham em uma redação de um veículo jornalístico. É a crise do mercado, e a crise do negócio, especialmente durante o ano de 2015.

     O positivo tem relação com um certo pensamento sinérgico e convergente. Com menos pessoas e mais trabalho, com a agilidade de produção necessária para entregar conteúdos tanto para a plataforma digital como para a produção impressa, as redações ficaram mais enxutas e as pessoas mais próximas. 



     O que observamos é que, agora, em muitas redações, não existem mais as baias. São mesas grandes, geralmente sem nenhum tipo de divisão. O editor fica no meio, a fim de facilitar o contato com todos. Outro fato curioso é a localização das mesas de reunião de pauta, que agora ficam no meio da redação. E todas aquelas telas de televisão mostrando diversos conteúdos são mais um componente desse novo ambiente que prima pela proximidade e, dessa forma, agiliza a comunicação entre o próprios jornalistas.

     Nesse contexto, o que mais vale destacar é que as redações de jornais, por exemplo, perderam o foco no famigerado deadline e de uma produção diária toda voltada para a veiculação impressa do dia seguinte, em prol de uma ação mais dinâmica que leva em conta o acervo digital e a necessidade de valorizar mais a internet e entregar conteúdos em temo real.

     Por isso, hoje as redações trabalham com dois times. Os que alimentam os sites, portais e redes sociais logo pela manhã, por isso os primeiros editores começam seu trabalho junto com o galo matinal.  A primeira reunião de pauta é geralmente às 7h e conteúdos são definidos até às 14h, com ampla atenção ao que alimentar em sites, portais e redes sociais. Assim ocorre com o Jornal O Dia, Meia-Hora, O Globo, Jornal Folha de São Paulo e Estado de Sâo Paulo. E os que trabalham para os jornais cuidam do fechamento a partir das 15h.

     E sexta-feira continua sendo o dia do famoso pescoção, em que editores e jornalistas fazem “cerão” para alimentar conteúdo para os fins de semana. Diante dessa realidade, ocorre o deslocamento do foco, antes voltado somente para a produção e agora voltado para a divulgação e compartilhamento. A partir de então, criam-se novos sistemas que viabilizam o diálogo entre fontes, leitores, jornalistas. 

     É o que pensa, por exemplo, Luis Fernando Bovo, editor-executivo de conteúdos digitais do Estadão. “Antigamente, pelo fato de a internet não ser tão enraizada, era mais complicado de saber o que acontecia lá fora e como é que essas informações chegavam aqui. Hoje em dia, esse processo se dá com uma facilidade maior. Você sabe os problemas que os jornais lá de fora enfrentam e são quase os mesmos problemas que a gente enfrenta aqui, logo, as soluções são parecidas”, explica o editor. 

     Um dos fatores que influenciou essa mudança foi a questão do que seria de interesse público ou interesse do público, modificando o olhar jornalístico para o sentido da transmissão de informações. Porém, Bovo revela uma visão curiosa quanto a essa questão do interesse. "Você é responsável pela audiência que tem e não o oposto. Não é ela que vai definir o que você está publicando. É você que tem que educar sua audiência para aquilo que você quer que ela leia. Esse é o papel do jornal. Existem coisas que ue publico no Facebook consciente que vai 0 likes, mas eu não estou preocupado com isso. Nós não produzimos pensando em colocar no Facebook. Olhamos nosso cardápio, o que tem dentro do nosso conteúdo e aí publicamos", afirma o editor.

     Mas ainda assim, muitos fatores da essência do jornalismo permanecem. Pensar em um público-alvo e aperfeiçoar sua linguagem para alcançar mais pessoas e diferentes públicos, incluindo, assim, saber novos tipos de linguagem, novas meios de acesso a informação e quem ele quer informar demonstra uma característica inerente ao jornalismo, o que justifica sua permanência e necessidade para os públicos.

     O melhor exemplo de mudança são as redes sociais que se tornaram um lugar de construção de falas e opiniões. Nesse espaço, o público tem a possibilidade de participar e colaborar com a produção de conteúdos. Uma atividade talvez inimaginável para o jornalismo no século passado, e hoje essa interação é considerada fundamental. 

     “Há alguns anos atrás, os leitores se comunicavam com os veículos por meio de cartas e, a partir do momento em que a redação ficou um pouco mais digital, passaram a mandar e-mails, que agora foram substituídos pelos posts no Facebook.”, relata o editor-chefe da revista Superinteressante, Denis Russo Burgierman.


Cidadãos como prosumers


     A partir da nova ideia de que os cidadãos também são produtores (o que no mundo acadêmico chamamos de prosumers) e, por meio da internet, conseguem emitir informações e opiniões, não se deve compreender esse fenômeno como um desaparecimento do jornalismo profissional e de empresas jornalísticas. Há, com a entrada do público, uma nova riqueza de informações, mais fontes primárias de informação e de opinião, maior possibilidade de aquisição de informação transversal e um reforço do controle social da informação. Tudo isso significa mais um avanço social muito importante, colocando o jornalismo em uma posição fundamental na gestão de informação profissional.


On line e off line: dois espaços distintos?


     A questão não pode ser jornalismo em plataformas impressas versus jornalismo em plataformas digitais. No esquema tradicional do fazer jornalístico exigia-se uma estrutura extremamente complexa. Demandava-se muito tempo para a produção da maioria das matérias devido à dificuldade de se obter as informações desejadas. As pesquisas eram feitas em arquivos em papel, por meio de contatos telefônicos ou pessoais, e tudo isso requeria tempo. 

     Já a cultura digital do século XXI tem o auxílio da internet para agilizar esse processo e da portabilidade e mobilidade dos dispositivos com alta capacidade técnica, o que auxilia sobremaneira na cobertura jornalística em áudio, fotografia e vídeo. Nesse novo momento, vivenciado pela área da comunicação, com as convergências do trabalho jornalístico e utilização cada vez maior das mídias, o novo jornalista se torna cada vez mais multifacetado, com cada vez mais responsabilidades e autonomias. 


As relações entre as gerações


     Geralmente, jornalistas mais jovens são encarregados de exercer multifunções, não só nas redações como também nas ruas. Quando a empresa sente a necessidade de exercer inovações no ambiente de trabalho, os jovens são, muitas vezes, as primeiras opções para as funções que trabalham com conteúdos virtuais e digitais. Um dos motivos para essa escolha seria a facilidade de atuação dos jovens em redes sociais e na web, mesmo fora do campo da comunicação. 

     A utilização de programas de edição e o incentivo de apostar em novas mídias como vídeos estão crescendo a cada momento e, na maioria desses lugares, o jovem possui papel fundamental para o funcionamento dessas áreas. Porém, isso obviamente não nega a atuação de jornalistas seniores na participação de criação desses conteúdos. Dependendo da empresa ou do tipo do jornal, eles podem exercer diferentes funções.



     Fato é que os cargos de chefia ficam ainda nas mãos de jornalistas mais antigos, bem como as editoriais de opinião. Seu trabalho passa a ser mais focado na parte organizacional do veículo, ao possuírem cargos na parte de direção e como editores do conteúdo produzido. Vimos também que a presença dos jornalistas antigos estava concentrada na área de fotografia e pesquisa nas redações. A questão é, seja junior ou sênior, todos os jornalistas tiveram que se adaptar às novas tendências do jornalismo. O avanço tecnológico e, por consequência, a alta demanda e ansiedade do público são os grandes fatores que alteraram esse cenário. Dessa forma, o jornalista do século XXI, nos atravessamentos dessa cultura digital, não está isento do exercício de múltiplas funções. No fim das contas, a idade nada mais é do que um vetor que independe dessa realidade 

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